sábado, 23 de junho de 2012

SONETO - IV - ENXAME DE FEL

O teu perfume sabe-me a mel
mas o zumbido da abelha mestre
é o aviso do solo equestre
que derrama o enxame do fel.

O desejo que me afecta a pele
é o lacre que nasce do cipestre
e esfola o deserto campestre
com as gargalhadas da boca cruel.

Invento a noite à velha lanterna
que deprime a cama de luzerna
onde o amor é um funeral.

Nada mais resta ao fresco coral
do que os cânticos do velho imoral
que dança aos sons de quem o inferna.

Caixa das Histórias de Paula Rego, Cascais, 04/12/2009 - Jorge Brasil Mesquita. Jorge Manuel Brasil Mesquita. Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 17H06.

O OBJECTIVO DE UMA OBJECTIVA SEM OBJECTIVO

Finalmente, cheguei à Cinemateca, depois de sair do Saldanha, de ter percorrido a pé a Fontes Pereira de Melo e meia Avenida da Liberdade. Entrei na Barata Salgueiro e, aqui estou eu, sentado no bar-restaurante das memórias que os fotogramas devoram com as lentes dos pigmentos mentais.
Sentado a bebericar uma água, deixei de ser quem sou, para me transformar numa objectiva, vasculhando o vazio que se impregnou em mim. Aos saltos, a objectiva assalta, meia embriagada, a memória dos olhos que me beberam a sexualidade muda, assusta-se com a penumbra que encontra, quando tenta penetrar nesse filme que se me grudou à pele, sem que lhe reconheça os lamentos do seu argumento: "Five Corners" de Tony Bill, com Jodie Foster e Tim Robbins.
A objectiva reconhece no esforço da banalidade, a grandeza de uma escolha: John Carpenter. A objectiva enlaça-se com o ritual do "The Fog", assusta-se com o remake "The Thing", desenha uma sequência de afinidades com o "The Starman", mergulha maravilhada nessa grande metáfora do "They Live", delira com a prisão imaginária de uma Nova Iorque prisioneira de si mesmo, descarrila com a fantasmagórica "Christine" e recolhe os delírios da actualidade no magnífico "Vampires" com esse excelente e mal compreendido actor James Woods.
Quem é John Carpenter?, Quem sou eu?, Objectiva sem objectivo na eloquência cinéfila de um cinéfilo perdido no fascínio de um B. A objectiva solta uma gargalhada e repara na fama dos afamados. Não sei bem porquê, mas Pavlov, objectiva-me a objectiva. É um olho de muitos olhares, é o encontro de uma duna com um arranha céus na fronteira marítima deste argumento que nada argumenta. É uma objectiva, nada mais que uma objectiva.
Cinemateca, 02/12/2009 - Jorge Brasil Mesquita. Jorge Manuel Brasil Mesquita. Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 16H57.

FALHOU-ME A LUCIDEZ....

Esta história não usa regras de lógica, coisa que ignoro.Tem todos os temperos da irracionalidade. Usei o meu escalpe como um troféu e pendurei-o numa tela branca pintada com as cores de uma romã rachada ao meio. Pus as minhas barbas de molho. O molho era de abacate. Senti que as verbas climáticas da minha temperatura de 0 graus, se traduziriam no investimento do meu corpo, que expunha a sua nudez esquelética, como um exemplo de escultura, para além do pós-moderno.
Optei por fazer um discurso, mesmo no centro da praça do Rossio, usando como retórica, as palavras mais bárbaras que conhecia. Ouvi algumas gargalhadas sem sentido e engoli todos os insultos com o maior dos à vontades, uma vez que a troca de línguas, é um linguado acústico, presenteado com uma feira de vaidades, onde todos se registam e nenhum resiste às labaredas saudáveis da irresponsabilidade moribunda. Quis suicidar-me no metropolitano para causar consternações, pânico e satisfações por haver menos um militante da vida. Contudo, cheguei à conclusão que os espectadores mereciam melhor espectáculo, pelo que resolvi estilizar-me como uma estátua da morte, todo vestido de branco, o que era um contra-senso, segundo alguns comentários atrozes que escutei, sugerindo que devia enforcar-me em público, reparem, não fingindo, mas usando uma realidade, em vez de uma farsa, o que me deu, pensei eu, a brilhante ideia de me transformar num farsante, mas concluí, rapidamente, que a concorrência seria muita e, num ápice, iria à falência.
Afinal, optei por ser um mentiroso convicto, o que daria grandeza à minha alma e espiritualidade ao meu raciocínio que, como já afirmei, é totalmente irracional.
Cansado de não ser famoso, anunciei ao mundo, em geral, que descendia directamente de uma iguana dos Galápagos e, tal como ela, considerava-me, em vias de extinção, o que, implicitamente, me ofereceria todas as garantias de uma vida faustosa. Adepto invertebrado da inveja, ri-me espalhafatosamente de todos os olhos que me devoravam com admiração, sem na realidade saberem bem porquê. Transformei-me numa encenação colectiva do amor em estado de guerra, sem qualquer ideia de paz.
Como esta ocasião é uma caixinha de surpresas, saltei e esmolei, como qualquer palhaço politiqueiro, por 15 minutos de fama, o que soprando numa gaita de foles, me daria direito à comissão do fole que afoguearia qualquer pardieiro, pelo que brandi com a maior falta de sobriedade, o gamanço de umas quantas palavras que me dessem direito à composição do século.
Com toda a singeleza, confesso que, repentinamente, me distraí e me perdi do objectivo que projectava, com objectivas filtradas pelos cenários grotescos dos flibusteiros pós-modernistas. E, como nada mais há do que esta confissão descolorida, pisgo-me para onde as realidades, nunca serão verdades factuais. Ámen.
Biblioteca de Oeiras, 14/12/2009 - 15H28 - Jorge Brasil Mesquita
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 16H45.

AFLUENTES POEMÁTICOS - XXII - ACORDAR A DOR DA INOCÊNCIA

A distância não afecta
a fome de ser quem sou
um vulto que se infecta
com a raiva que negou
o vírus que nos detecta
o bobo que nos julgou
sem conhecer o profeta
que nada profetizou.

Acordar a dor da inocência
com a fuga de uma pureza
é vestir a cor da violência
co´a morte velha da beleza.

As farsas do quotidiano
são viveiros de cultura,
nacos do mito ufano
em versos de tortura
e réus de corpo insano
que viajam na tontura
de não verterem o dano
às facas do véu humano.

Ouvir as forcas do ocaso
na virgindade da nascente
é inventar o mortal prazo
à agua de uma semente.

E nada será urgente
no berço da nossa idade
nem a coragem carente
nem a fluência da verdade
roendo o caruncho vidente
que se alarga à vontade
de cobrir o nosso poente
co´o caos da Humanidade.
Centro Cultural de Belém, 29/11/2009 - Jorge Brasil Mesquita. Jorge Manuel Brasil Mesquita. Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 14H22.

ZIPS SONOROS - XIII - AU PAIRS

“Tudo é político, tudo o que se faz na vida, a forma como as pessoas se relacionam entre si é político”, afirmou Lesley Woods, vocalista e letrista, do grupo Au Pairs, à East Village Eye.
O grupo inglês Au Pairs formou-se, em 1979, na cidade de Birmingham, por Lesley Woods, Paul Foad, Jane Munro e Pete Hammond. Musicalmente, o grupo aliava, a uma certa dose de experimentalismo sonoro, as influências musicais do Ska, do Reggae e da Pop. As letras de Lesley Woods eram consideradas provocativas no modo como perspectivavam o feminismo, quanto ao género e quanto à sexualidade. “You´re equal but different” é uma das expressões que se pode ouvir numa das suas melhores composições “It´s Obvious”, o que exemplifica, claramente, a faceta de Lesley Woods na construção das suas letras.
Como é habitual, segue-se a discografia dos Au Pairs e das editoras independentes por onde passaram.

021:
1980 – 7” – You/Domestic Departure/Kerb Crawler.
Novembro de 1980 – 7” – It´s Obvious/Diet

Human:
Abril de 1981 – LP – Playing With a Different Sex
Julho de 1981 – 7” – Inconvenience/Pretty Boys

Kamera:
Agosto de 1982 – LP – Sense and Sensuality.

Os Au Pairs é um dos meus grupos preferidos da Indielândia, com destaques para o já referido “It´s Obvious” e para o LP “Playing With a Different Sex” que inclui uma versão alargada do “It´s Obvious”.
Oeiras, 07/11/2009 – Jorge Brasil Mesquita
Moinho das Antas, 10/01/2010 - Jorge Brasil Mesquita - 12H02

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 14H07.

FRICÇÕES - VI - RIO+20

O Senhor Moço de Recados da União Europeia empertigou-se, bombeou uma dica de pólvora seca, e, depois, feliz da vida, regressou, silencioso, ao convés pantanoso das trivialidades atmosféricas.
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Criado, em 22 de Junho de 2012, à noite, na cama, por volta das 22H20.
Escrito, directamente, no blogue, no dia 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H56. 

CRITICARTE - XV - JIM THOMPSON

É comum afirmar-se, entre os críticos literários, que os livros policiais correspondem a um género de literatura menor. Felizmente, que eu sou susceptível a qualquer tipo de literatura, desde que o livro que leia, seja um prazer de subtilezas, de clarins de sentimentos, muitas vezes desencontrados, ou um rumor de florescências que desembocam em prazeres de vários idiomas.
É o caso do livro e do escritor que, hoje, escolhi, como exemplo de uma riqueza esfusiante.
O escritor Jim Thompson (1906 – 1976), exerceu durante a sua vida os ofícios de empregado de hotel, de actor, de escritor de espectáculos cómicos, de especialista em explosivos, de jogador profissional de jogos de azar e de colaborador de vários jornais. Foi argumentista dos filmes “Um Roubo no Hipódromo” e “Paths of Glory” de Stanley Kubrick. Participou com pequeno papel numa nova versão de “Farewell My Lady” de Dick Richards, baseado no policial de Raymond Chandler, com o mesmo título.
Foram adaptados ao cinema os seus livros “Getaway” de Sam Peckimpah e “Pop 1280” de Bertrandt Tavernier.
“Pop 1280” de Thompson é o livro escolhido de hoje. O enredo tem como epicentro Nick Corey que passa por ser um xerife psicopata que vive numa aldeia com 1280 almas, onde a corrupção o cerca por todos os lados. Ao decidir limpar tudo, provocou consequências terríveis. Este é um mundo sem Deus, povoado por pessoas para quem o homicídio não é mais do que um biscate ocasional.
“ Eu já tinha estado naquela casa algumas cem vezes; naquela e noutras do mesmo tipo, mas era a primeira vez que as via tal como eram. Não eram casas nem espaços para as pessoas viverem, nem nada, apenas paredes em pinho a cercarem o vazio. Não havia fotografias, nem livros, nada para onde olhar ou reflectir. Apenas o vazio que começava a impregnar-me aqui, por todo o lado, em todas as casas como esta. De repente este vazio ficou preenchido com som e imagem em todas as coisas tristes e terríveis que esse vazio tinha trazido às pessoas.”
Este livro é um belo exemplo do romance de humor negro americano.
Penso que é importante, explicar que, da minha parte, estas escolhas se baseiam em gostos pessoais de leituras feitas. É claro, que elas se sustentam em críticas que foram, igualmente, lidas, mas nunca deixarão de ser escolhas pessoalíssimas.
Oeiras, 16/10/2009 – Jorge Brasil Mesquita

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H48.

MEMÓRIAS SONORAS - XIII - "SIR DUKE"

Um negro de nome Berry Gordy, ex-pugilista, ex-dono de uma discoteca, ex-trabalhador de uma linha de montagem de automóveis, em Detroit, EUA e compositor de “Reete Petite”, interpretada por Jackie Wilson e de “Money”, cantada por Barret Strong, fundou em Detroit a editora Tamla Motown num edifício da cidade intitulado Hitsville, USA, editora que Gordy considerava como “The Sound of Young América”. A Tamla Motown era dirigida por negros e, praticamente, todos os grupos e intérpretes da editora, também o eram. Sem dúvida que a Motown foi uma das várias fatias negras que contribuíram para que, hoje, haja um Senhor Obama negro, como Presidente dos EUA. A editora era controlada, sonoramente, e sofisticada em políticas de educação social, até aos mais pequenos pormenores, inserida numa linha de compositores, como, por exemplo, Smokey Robinson e a tripla Holland-Dozier-Holland que produziram canções que todo o mundo consumiu nas vozes dos Smokey Robinson and The Miracles, das Supremes, dos Temptations, dos Four Tops, de Marvin Gaye, dos Jackson Five e de Stevie Wonder.
Stevie Wonder nasceu em Saginaw, Michigan a 13 de Abril de 1950, cegando durante a sua infância. O seu nome Steveland Morris foi alterado para Little Stevie Wonder quando assinou o contrato com a Motown. A harmónica tornou-se numa das suas imagens de marca, a partir das suas primeiras gravações, em que se inclui o seu primeiro grande sucesso “Fingertips-Pt2”, em 1963, a que se seguiram inúmeras composições que o guindaram ao estrelato, até que, ao atingir os 21 anos em 1971, Stevie Wonder se libertou das amarras que o privavam da sua liberdade criativa. Os álbuns “Music f My Mind” e “Talking Book” de 1972 e “Innervisions” de 1973, são os primeiros passos do seu processo criativo, nomeadamente, “Talking Book”. Em 1976, Stevie lançou o duplo álbum “Songs In The Key Of Life” onde se inclui um tributo a um dos gigantes do jazz, Duke Ellington, através da composição “Sir Duke”.
A cultura do jazz é uma viagem humana que se aprende e ensina com a linguagem sonora do improviso individual e colectivo, desde as raízes da sua origem, até aos frutos da sua eternidade.
Duke Ellington ( 29 de Abril de 1899 – 24 de Maio de 1976), nasceu em Washington e desde muito criança aprendeu a tocar piano e harmonia. Em 1914 compôs os seus primeiros temas. Lidera vários grupos a partir de 1918 e em 1924 forma a banda Washingtonians que, entre 1927 e 1931, actua no Cotton Club, em Harlem, clube onde só actuavam músicos negros e a assistência era exclusivamente composta por brancos. As actuações no Cotton Club proporcionaram-lhe uma enorme projecção, dentro e fora dos EUA, abrindo-lhe as portas da Europa, onde efectuou um sem número de digressões. Durante a década de 50 Ellington passou por fase de declínio que, posteriormente, viria a ser alterada com a sua presença no Newport Jazz Festival em 1956 que reavivou a sua popularidade que se prolongaria até à sua morte em 1974.
Com uma longa discografia, não só como músico, mas, igualmente, como compositor, destaco a contribuição musical e uma pequena participação, em 1959, no filme “Anatomy of a Murder” de Otto Preminger e as suas composições “Sophisticated Lady”, “In a Sentimental Mood” e “Mood Índigo”. A música de Ellington é a “marca de uma verdadeira sofisticação que é uma audaciosa simplicidade”.
“Sir Duke” de Stevie Wonder é a memória sonora de hoje.

www.youtube.com/watch?v=6sIjSNTS7Fs

Sir Duke Lyrics

Music is a world within itself
With a language we all understand
With an equal opportunity
For all to sing, dance and clap their hands
But just because a record has a groove
Dont make it in the groove
But you can tell right away at letter a
When the people start to move

They can feel it all over
They can feel it all over people
They can feel it all over
They can feel it all over people

Music knows it is and always will
Be one of the things that life just wont quit
But here are some of musics pioneers
That time will not allow us to forget
For theres basie, miller, satchmo
And the king of all sir duke
And with a voice like ellas ringing out
Theres no way the band can lose

You can feel it all over
You can feel it all over people
You can feel it all over
You can feel it all over people

You can feel it all over
You can feel it all over people
You can feel it all over
You can feel it all over people

You can feel it all over
You can feel it all over people
You can feel it all over
You can feel it all over people

You can feel it all over
You can feel it all over people
You can feel it all over
I can feel it all over-all over now people

Cant you feel it all over
Come on lets feel it all over people
You can feel it all over
Everybody-all over people

Stevie Wonder

Jorge Brasil Mesquita
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H34.

FRICÇÕES - V - PARTIDO SOCIALISTA

O Partido Socilaista é o pneu furado da esquerda portuguesa. Esquerda? O que é isso, perguntam eles de beiços caídos. Santa ignorância!
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Criado, em 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H19.
Escrito, directamente, no blogue, no dia 23 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, ás 13H20.