quarta-feira, 20 de março de 2013

O AMOR DE NÃO O SER

Sentado, em um banco do jardim do Príncipe Real, observo a elasticidade da vida que passa, zumbindo, diante dos meus olhos. Consulto o meu Swatch. São horas de me encaminhar para o Instituto Britânico. Pego na minha pasta da Tapioca, ligo-me ao iPod e aos Palma Violet e, sem pressa, tenho tempo, levanto-me e caminho por entre árvores sem idade, por entre corpos que dialogam, em conversas banais, em conversas amorosas. Desço a rua, entro na livraria, fronteira ao Instituto, e consulto o espaço dedicado aos livros de música. O Swatch apressa-me. Entro na classe do sétimo ano. Ao entrar, a verdade estremece-me o corpo, aumenta-me o ritmo cardíaco. Ao vê-la, deixo de ver; o professor e os outros alunos são apenas esculturas de carne viva que se enclausuram em um quadro vivo de aparências teatrais. Os seus olhos, de uma claridade assombrosa, encontram-se com os meus, acenam-me sorrisos e, eu, corpo dançarino, envio-lhe uma saudação repleta de alegrias que, verdade seja dita, só este meu sentimento de jovem seduzido, compreende em toda a sua verdadeira extensão. Neste entorpecimento amoroso, o professor é um ruído de fundo, uma voz que nos explica o que não sei explicar, um relatório qualquer que me desgosta o gosto da sua presença divinal. O tempo não tem obstáculos, mas a minha timidez é um obstáculo. A sineta soa, aos meus ouvidos, como uma canção de embalar. Saiem todos, saio, eu, sai, ela, saímos para o mundo da consciência aberta, fechando os meus desejos, ocultando, mais uma vez, a razão das minhas razões. Junta-se, alegre, ao seu grupo habitual e, eu, pego no meu corpo, sem destino, e fujo, literalmente, do brilho que me encadeia os passos, lentos e tensos, e escondo-me, em um canto da esplanada, no jardim do Príncipe Real. Abro a pasta e, dela, retiro os "Diários" de Al Berto. Com eles sigo por onde nunca seguirei. Eis-me inteiro e dividido entre o gosto de ser amado e o desgosto de não o ser.       
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Escrito e postado, diretamente, no blogue, em 20 de Março de 2013, na Biblioteca Nacional de Lisboa, entre as 14H20 e as 15H14.