quinta-feira, 21 de junho de 2012

NÃO SEI

Quem sou eu nesta terra de ninguém? Não sei. Ulysses a caminho de Ítaca, não sou. Não sei. Nem Kant me alivia a Razão. Alguém me espera nos cantos do amor? "Never More", diz-me o Corvo curvado sobre a minha falta de identidade humana. Que culpa se gera no ômega da indiferença? Não sei. Não sou réu da vida que se debruça sobre o vento e que apalpa as palavras do pensamento. Serei o desejo da noite mais obscura? Não sei. Sou demoníaco na lavra da mensagem, mas austero na impertinência da coragem. Que desespêro é este que refulge na balança dos justos? Não sei. A espada da eternidade pende sobre a cabeça do fogo e os dedos de veneno saudável revolvem-se como serpentes de uma vingança que desconheço, mas Medusa não sou. Serei a esfinge de uma demagogia simplória abraçando a ditadura democrática que me asfixia? Não sei. Desconheço a farsa que me modela a razão, mas não me disfarço perante os demagogos a quem os hábitos do monge se perfilham como a clorofila das suas agonias mordazes. Quem sou nestas gerações de beat claustrofóbico? Não sei. Murmuro, assobio, e pergunto ao país, mas o verso nada me diz. Não sei, mas sei que não sei.  
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Criado, em 21 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H44.
Escrito, directamente, no blogue, no dia 21 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H45, e, concluído, às 14H17 do dia 21 de Junho de 2012.

A TORRE DA VERDADE

Olhei para os ponteiros do relógio, no alto da Torre da Verdade.Não se moviam, nem para um lado, nem para o outro. Simplesmente inamovíveis.
O Sol, uma bola de fogo implacável, escouceava ao acaso. Por precaução, abri o guarda-chuva protector. Tinha a noção exacta do tempo que ia fazer. Tinha a certeza que o Sol ia chover, a qualquer momento. Os fios de luz intensa assemelhavam-se a picadas precisas que atingiam os neurónios com a distinção da morte da vida humana. Atravessei a rua com a lentidão de um camaleão, sem que houvesse simulação de cores. Habituara-me à sede insaciável, bebendo as minhas próprias lágrimas, que paridas de verdade, serviam-me de bússola na passadeira da vida.
Quando a chuva parava, secava o silêncio, e eu ouvia na brisa do vento, a eternidade dos anúncios às vidas breves. Olhei, de novo, para o relógio da Torre sabendo que era um painel, piscando os códigos indicifráveis de cada segundo que fustigava o ritmo do seu colapso. Não me sentia afectado, porque as florestas impenetráveis desta minha razão, rugiam, inconsoláveis, às células da inércia.
Por vezes, permitia que um naco de luz iluminasse recantos que eu próprio desconhecia habitarem na floresta em que me tornei. A floresta representava uma torneira que se fechava, fechando-me a fonte das rotas que podiam abrir as clareiras do conhecimento que me desconhecia.
O espanto apossava-se de mim, ao ver que, ciclicamente, o Sol não forçava a penetração desta floresta, o que produzia em mim uma espécie de frescura que eu abraçava como um amor escondido na noite do infinito.
Todos os dias subia, num estado de embriaguês vivificadora sufocante, ao alto da velha e decrépita urbe que não resistira ao colapso da vida. Deste modo ia gastando as memórias que me restavam e atravessava a minha floresta com todas as imagens que ainda povoavam os povoados que separavam os mistérios dos segredos. Acabavam por ser a fome da minha fome que estava reduzida ao silêncio que tudo consumia. Não havia sombras que me acolhessem em lugar algum. A floresta tornara-se num refúgio interior que eu reconhecia ser inútil, quando todo eu não fosse mais do que um poente irrepetível.
Cansado de ser um guarda-chuva de mim mesmo, deixei que o Sol queimasse cada pedaço da minha floresta e olhei, temerariamente, para aquela luz incandescente, sorrindo, e permiti que cada intimidade do meu corpo escorresse como lava e, sem que uma lágrima me bebesse, juntei-me às cinzas que eram o mar da realidade que se podia observar no relógio fossilizado, no alto da Torre da Verdade.
Costa da Caparica, 16/12/2009
Biblioteca de Oeiras, 22/12/2009 - 14H08
Jorge Brasil Mesquita
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 21 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H39.

ZIPS SONOROS - XI - FIRE ENGINES

Se é certo que no último capítulo destes espaços dedicados a bandas que nasceram e se ligaram a editoras independentes, abandonámos a editora Postcard, a verdade é que continuaremos na Escócia para falarmos de outra banda de Edimburgo, formada, em 1979, por Davey Henderson, Murray Slade, Graham Main e Russel Burn que adoptaram o nome de Fire Engines, nome extraído de uma das faixas do LP “The Psychedelic Sounds of: 13th Floor Elevators” dos 13th Floor Elevators, de 1966. Sonoramente, os Fire Engines beberam as suas influências em Captain Beefheart, no grupo Estado-Unidense, Contortions e nos grupos ingleses Pop Group e Gang of Four.
A banda, nos seus primeiros tempos de vida, não fazia concertos com mais do que 15 minutos porque, segundo o vocalista Davey Hendersen, “que interesse há em manter a audiência enfastiada?!”.
Ao gravarem o seu primeiro 7”, o grupo comentou que “queríamos fazer um “mau” 7” que fosse grandioso e fizémo-lo”: “Get Up and Use Me”. Uma completa anarquia sonora – acrescento eu. Em 1981, os Fire Engines assinaram contrato com Bob Last, outro editor discográfico escocês independente que competia com Alan Horne, primeiro para a Fast Product que se transformou em Pop: Aural. Da discografia do grupo, que enunciarei, como é usual, gosto, particularmente, do tema “Candy Skin”.

Codex Communications:
Dezembro de 1980 – 7” – Get Up and Use Me/Everything´s Roses

Fast Product:
Janeiro de 1981 – LP – Lubrificate Your Room

Pop: Aural:
Maio de 1981 – 7” – Candy Skin/Meat Whiplash
Novembro de 1981 – 7” – Big Gold Dream/Sympathetic Anaesthetic.

Fontes: “Rip It Up and Start Again”, livro de Simon Reynolds e o jornal New Musical Express.
Oeiras, 22/10/2009 – Jorge Brasil Mesquita

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 21 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H27.