quinta-feira, 28 de junho de 2012

AMIGOS DA ONÇA

Num destes dias, escutei com liberdade, numa mesa pública de um café da selva urbana, uma conversa de uma onça e dos seus amigos.
Começou por dizer que tentara comprar um GPS, mas o orçamento não lho permitia. Porém, conseguiu reunir um grupo de amigos e explicou-lhes o objectivo de tal aquisição. Que não se destinava à sua orientação num qualquer deserto e muito menos para se orientar nas ruas da selva. A sua ambição era outra. Com a ajuda de todos e de uma aparelhagem mais sofisticada, podia penetrar, habilmente, em uma qualquer casa de famosos, espiar-lhes as cenas mais picantes ou escabrosas, conforme os casos, e usá-las, de uma forma delicada, para cobrir as despesas dos tais aparelhos sofisticados. Mas a onça não se ficou por aí. Elaborou um plano e um método, em que podia espiar à vontade os rascunhos de certos jornalistas e, com eles, vender a jornalistas de jornais diferentes, revelações sensacionais, que cada um deles pudesse eventualmente dispor, identificando-se como sendo uma fonte privilegiada. Se as mesma notícias aparecessem em diversos jornais, quem se daria ao trabalho de acorrentar a fonte, perguntou a onça, com um sorriso nos lábios. Mas o sistema não parava por ali. Com estudos laboriosos, escolheria alguns escritores famosos portugueses e copiar-lhes-ia os originais que, rapidamente, espalharia por um mercado ávido de novidades literárias e com a possibilidade de aparecerem com o nome de outro autor. Pelo menos, dizia ele com uma grande dose de ironia, que por este processo nunca seria necessário roubar computadores de um qualquer escritor. Mas, verdadeiramente, o que mais interessava à onça, era poder copiar e manipular os discursos rabiscados dos políticos. Imaginava ele, o gozo que seria um político ir discursar a Condeixa-a-Nova e a população inteira rir-se às gargalhadas com os enganos do político, que é como quem diz, com os efeitos da onça. Afirmou a onça, descaradamente, que por este processo, viveríamos numa Democracia muito mais aberta. E a Justiça, alvitrou um dos amigos? Não me preocupo com a Justiça, porque essa anda meia perdida com as injustiças da Justiça. Garanto-vos que só assim viveríamos numa verdadeira Democracia, onde todos se tornarão em amigos da onça. As gargalhadas foram gerais, perante as doces e compensadoras perspectivas que toda uma selva destas lhes abria.
Mudo e quedo, levantei-me do café e percebi, finalmente, o "1984" de Orwell.
Biblioteca de Oeiras, 17/12/2009 - 14H01 - Jorge Brasil Mesquita
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 28 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 17H10. 

MEMÓRIAS SONORAS - XVII - "GHOST TOWN"

Nos finais da década de 70, formou-se, em Inglaterra, uma pequena editora discográfica, a Two-Tone, a que estiveram ligados na sua fase inicial, grupos como os Madness, os The Beat, os Selecter e, especialmente, os Specials, onde predominava a força impulsionadora e criadora da Two-Tone e do grupo, Jerry Dammers. A editora girava, musicalmente, à volta de uma mistura entre o Punk, a Soul, o Ska e o Reggae. Porém, a memória sonora que aqui pretendo recordar, pertence a uma composição de Dammers, de 1981, cujo título “Ghost Town” traduzia as consequências do declínio da indústria automóvel, em Coventry, terra natal da Dammers. Inesperadamente, a canção ganhou uma maior notoriedade porque o seu lançamento coincidiu com os motins registados no gueto de Brixton, transformando a composição numa espécie de fotografia sonora dos resultados gerados pelos motins.

www.youtube.com/watch?v=RZ2oXzrnti4

The Specials - Ghost Town

This town, is coming like a ghost town
All the clubs have been closed down
This place, is coming like a ghost town
Bands won't play no more
too much fighting on the dance floor

Do you remember the good old days
Before the ghost town?
We danced and sang,
And the music played inna de boomtown

This town, is coming like a ghost town
Why must the youth fight against themselves?
Government leaving the youth on the shelf
This place, is coming like a ghost town
No job to be found in this country
Can't go on no more
The people getting angry

This town, is coming like a ghost town
This town, is coming like a ghost town
This town, is coming like a ghost town
This town, is coming like a ghost town
Jerry Dammers
Jorge Brasil Mesquita

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 28 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 16H56.

MEMÓRIAS SONORAS - XVI - "KLU KLUX KLAN"

O Reggae conheceu uma forte difusão, em Inglaterra, na década de 70. Um dos grupos ingleses que aderiu ao Reggae e ao Rastafarismo, foram os Steel Pulse que se formaram em 1975, na Handsworth School, em Birmingham, constituídos por David Hinds, Basil Gabbidon e Ronnie McQueen. A primeira gravação do grupo, “Kibudu, Mansetta and Abuku”, foi lançada na editora independente Dip e, musicalmente, estabelecia um compromisso entre os sons de uma juventude negra urbana e os da imagem de um grande lar africano. A segunda gravação saiu na Anchor com o tema “Nyah Love”. O grupo viu serem-lhes recusados espectáculos nos Midlands ingleses devido à sua adesão ao Rastafarismo. Participaram na organização do Rock Against Racism. Com a participação em espectáculos como suporte de uma grandes intérpretes jamaicanos de reggae, Burning Spear, proporcionou-lhes um contrato com a editora Island Records. “Klu Klux Klan” foi o primeiro lançamento da editora e o tema, que abordava os demónios do racismo daquela seita, é a memória sonora de hoje.
O Klu Klux Klan é o nome de uma seita, fundada nos Estados Unidos da América, em 24/12/1865, em Pulaski, sede de distrito, no Tennessee meridional, a 80 milhas de Nasheville, próximo do Estado do Alabama, por Calvin E. Jones, Frank O. McCord, Richard Reed, Jonh B. Kennedy, John C. Lester e James R. Crowe, todos eles desmobilizados do exército dos Confederados.
O nome da seita provém da palavra grega Kuklos – faixa ou círculo – que foi dividida em duas palavras: Ku e Klos que modificado se transformou em Ku Klux. Como todos tinham ascendência escocesa foi proposta e aceite a palavra escocesa Clan que se tornou em Klan.
Visto que o Klan visava, primordialmente, a pureza e a preservação do lar e a protecção das mulheres e das crianças e, em especial, das viúvas e dos órfãos dos soldados Confederados, o branco, símbolo da pureza, foi escolhido para as túnicas e para que fossem notadas e despertassem temor, o vermelho, símbolo do sangue, que os homens do Klan estavam dispostos a derramar em defesa dos fracos, foi escolhida para as guarnições.
No Covil de Pulaski, num lugar chamado “A Enseada”, um anfiteatro natural no fundo da floresta, ficou decidido que o futuro e a finalidade do Klu Klux Klan, fosse a manutenção da supremacia branca.
A estrutura primitiva formal do Klan era formada, em cada Estado por um Reino, governado por um Grande Dragão; cada distrito congressional era um Domínio, governado por um Grande Titã; e cada Condado, uma Província gerida por um Grande Gigante. Toda a área coberta pelo poder do Klan, constituía o Império Invisível.
A finalidade deste texto dedicado ao Klu Klux Klan, teve, apenas, como objectivo revelar a origem, a estrutura e a finalidade da seita nos seus primeiros anos de vida que foi baseado no livro “The Klu Klux Klan” – a Century of Infamy, de 1965 e da autoria dWilliam Peirce Randel.

www.youtube.com/watch?v=yULRZ3zLXc8

Steel Pulse - Ku Klux Klan Lyrics
Walking along just kicking stones
Minding my own business
I come face to face, with my foe
Disguised In violence from head to toe.
I holla and I bawl (Ku Klux Klan)
But dem naw let me go now
To let me go was not dem intention
Dem seh one nigger the less
The better for the show
Stand strong black skin and take your blow
It's the Ku, the Ku Klux Klan
Here to stamp out blackman yah
The Ku, the Ku Klux Klan heh!
To be taught a lesson not to walk alone
I was waiting for the Good Samaritan
But waiting was hopeless
It was all in vain
The Ku Klux Klan back again
I holla and I bawl (Ku Klux Klan)
Dem naw let me go now
Dem seh one nigger the less
The better the show
Stand strong blackskin and take your blow
The Ku, Ku Klux Klan
Rape, lynch, kill and maim
Things can't remain the same yah no!

Blackman do unto the Klan
AS they would do to you
In this case hate they neighbour
Those cowards only kill who they fear
That's why they hide behind
The hoods and cloaks they wear
I holla and I bawl, Ku Klux Klan
Dem naw let me go no, Ku Klux Klan
Oh no, oh no...
Here to stamp out black man yah
Rape, lynch, kill and maim
Things can't remain the same yah
No, no, no, no.
David Hinds, Basil Gabbidon e Ronnie McQueen
Oeiras, 01/11/2009 – Jorge Brasil Mesquita

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 28 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H44.

CRITICARTE - XVII - "PEDRO PÁRAMO"

Será um escritor um redactor de palavras que nos reinventa em passagens que todos reconhecemos nos filtros do tempo ou será um bálsamo que nos denuncia o cume das profundezas humanas, onde há existências que desconhecem as vidas que vivem?
O escritor mexicano Juan Rulfo (1918 – 1986), escreveu em 1959 a obra “Pedro Páramo”, cujo enredo se desenrola numa pequena aldeia do interior do México, onde os habitantes que a habitam, sobrevivem à morte aparente dos seus destinos, entre as portas que escondem o real ou o fantástico.
“Entreabre os olhos. Vê através dos cabelos uma sombra no tecto com a cabeça em cima do seu rosto. E em frente a figura embaçada, por detrás da chama das suas pestanas. Uma luz difusa, uma luz no lugar do coração, em forma de coração pequeno que palpita como chama pestanejante. – Está a morrer de pena o teu coração – pensa – já sei que vens dizer-me que Florêncio morreu, mas isso já eu sei. Não te aflijas com os outros, não te preocupes comigo. Eu tenho guardada a minha dor num lugar seguro. Não deixes que se apague o coração.”
Carlos Fuentes, outro grande escritor mexicano, afirmou que “a arte de Juan Rulfo exprime-se tão profundamente através da transfiguração mítica das suas personagens que esta acaba por incorporar a temática do campo e da revolução mexicana num contexto universal.”
“Pedro Páramo” não deixa de ser um cenário minimalista da globalização humana.
Oeiras – 07/10/2009 – Jorge Brasil Mesquita

Jorge Manuel Brasil Mesquita
Recriado, em 28 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 13H36.