quinta-feira, 26 de abril de 2012

CANÇÕES - II - NA VERDURA DA IDADE

No mercado da Ribeira
ardem amores platónicos,
em calores de piteira,
nos sabores mais irónicos,
e na verdura da idade
que vagueia pela cidade
à procura do Chiado
onde a morna é Fado.

E se tudo é moda
na voz da grande roda
o que gira são flores
em nome dos amores
feitos das muitas cores
que desfloram as dores.

A chuva crente de Abril,
cravo rubro que vigora
num Bairro Alto febril
onde o vinho devora
o prazer de esquecer
quem nos remenda o ser
a essa coragem aflita
que se nos cola e grita

que a flor de toda a vida
é a dor dessa ferida
que a todos nos consome
como se a nossa fome
não sentisse o pudor
que acende todo o amor

ao corpo que o deseja
e à raiz que o despeja
no estrume da vida,
no cerne da ferida
para que a dor vencida
liberte a voz perdida.
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Escrito, diretamente, no blogue, na Biblioteca Nacional, no dia 26 de Abril de 2012, às 14H27, continuado, às 17H06, às 18H34 do dia 27 de Abril de 2012, e, concluída, às 15H09 do dia 30 de Abril de 2012.

CANÇÕES - I - AMOR DE SERTÃO

Sei de uma canção
que lavra o amor
sem a dor de Sansão
e a fava do fervor.

Tem brasas no olhar
e gelo na paixão
são borras de amar
em honras de sertão.

E quem se escuda
na garganta muda,
ou sofre de pranto,
ou morre de espanto
nos sonhos da beleza,
porque quem se canta
do pó se levanta
e ao fogo remata
a febre que mata
o fulgor da tristeza.

Sei de uma amante
que ama o amor
da fome distante,
da noite sem dor

e da salsa morna
que acorda quente
quem o frio adorna
na boca do poente.

E quem se derrete
acende o ferrete
às lavas do ciúme
nas asas do lume
que voam prá lá do vento
sem olhos de noite,
e quem as acoite
em lençóis de drama
e sonhos que a cama
grita ao doce alento.

cantei por cantar
o medo que fala
sem fugir ao mar
que, terno, embala

a canoa que canta
o fogo da calma
que, no corpo, planta
o siso da alma.
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Escrito, diretamente, no blogue, na Biblioteca Nacional, no dia 26 de Abril de 2012, às 13H43, continuado, às 16H52 e, às 18H07 e concluído, às 15h03 do dia 27 de Abril de 2012