CRITICARTE - V - ITALO CALVINO
Quando me lanço à leitura de certos escritores, sou, geralmente, atiçado pelos princípios dos estímulos sensoriais que se agitam no meu interior, provocados pelos seus actos de criação literária. Italo Calvino, confesso, foi paixão à primeira vista. Italo Calvino nasceu em Santiago de las Vegas, Cuba, no ano de 1923 e faleceu em Siena, Itália, em 1985. Sendo italiano, permaneceu em Itália quase toda a sua vida, com a excepção dos 13 anos vividos em Paris, França.Estudou em San Remo até aos 20 anos, incorporando-se na resistência contra o fascismo e contra a ocupação nazi, aderindo ao Partido Comunista Italiano que abandonou, a quando da insurreição húngara. Instalou-se em Turim, após a II Grande Guerra Mundial e ingressou na editora Einaudio, aproveitando para se licenciar em Letras e ocupando o lugar de consultor literário da mesma editora.Na temática das suas criações literárias pode-se encontrar a coexistência do realismo com a fantasia, dando vida a uma realidade transfigurada.De todas as suas obras, seduziram-me, além da trilogia "Os Nossos Antepassados", composta pelo "Visconde Cortado ao Meio" de 1952, "O Barão Trepador" de 1957 e o "Cavaleiro Inexistente" de 1959, os livros "Cosmicómicas" de 1965, "As Cidades Invisíveis" de 1972 e "Palomar" de 1983.Como aperitivo literário, apresentarei pequenos resumos e alguns excertos de alguns dos livros mencionados."O Visconde Cortado ao Meio": um clássico da literatura fantástica em que o real e o imaginário se fundem numa unidade perfeita. A fantasia, a fábula, a ironia são um desafio contínuo à frieza inumana do mundo moderno."Não há noites de lua em que, nos animais perversos, as ideias pérfidas não se enredam como ninhadas de serpentes e em que, os animais bondosos, não floresçam lírios de renúncia e dedicação. Deste modo, as duas metades de Medardo vagueavam atormentadas por diferentes e opostos propósitos pelos despenhadeiros de Terralba.""Cosmicómicas": Qfwfq, protagonista do livro conta as suas aventuras nas épocas mais remotas da história cosmológica, astronómica, geológica e biológica, afirmado ter sido testemunha ocular de todos os conhecimentos ocorridos desde o Big Bang."E no fundo em cada um dos olhos habitava eu, ou seja, habitava outro eu, uma das imagens de mim e encontrava-me com a imagem dela, no ultramundo que se abre ao atravessar a esfera semi-líquida das íris, o escuro das pupilas, o palácio dos espelhos das retinas, o nosso verdadeiro elemento que se estende sem margens nem confins.""Palomar": será possível encontrarmos um sentido nas coisas do mundo à nossa volta? E dentro de nós próprios? O Sr. Palomar está muito longe de ter a certeza quanto a tudo isso. Todavia, continua à procura. O Sr. Palomar é sem dúvida o autor, mas não só. Somos todos nós os leitores deste livro."O Sr. Palomar caminha ao longo de uma praia solitária. Encontra poucos banhistas. Uma mulher jovem está estendida na areia, apanhando sol com os seios descobertos. Palomar, homem discreto, volve o seu olhar para o horizonte marinho. Sabe que em semelhantes circunstâncias quando um desconhecido se aproxima, as mulheres, geralmente, apressam a cobrir-se e isso não lhe parece bem; porque é aborrecido para a banhista que apanha sol tranquilamente; porque o homem que passa importuna; porque o tabu da nudez fica implicitamente confirmado; porque as convenções não inteiramente respeitadas propagam a insegurança e a incoerência no comportamento, em vez da liberdade e da fraqueza."A conversa entre mim e o escritor Italo Calvino, talvez tenha sido longa demais, mas foi concerteza saborosa para quem apreciar leituras que estimulem os navios que nunca naufragam porque conhecem bem as rotas que traçaram.Biblioteca de Oeiras, 03/12/2009 - Jorge Manuel Brasil Mesquita. Recriado, em 29 de Maio de 2012, na Biblioteca Nacional,às 13H37.
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