terça-feira, 5 de junho de 2012

HARMONICA BLUES - V

Acabado o blues, a poeira dos meus olhos desvaneceu-se. Os diabinhos rubros com rabinhos doirados - o Grul e o Grol - suspenderam a marcha dos skates. Diante de nós, o alcatrão estava entravado pelos buracos das saudades. Saudades da memória que, ora se expandia, ora se encolhia, perante as visões futuristas  do seu passado assombrado. Mergulhei nas rotas de um deles e respirei a longa "Estrada" da sobrevivência, onde pai e filho inventam a solidariedade do amor. Em um outro buraco, divisei os vultos de Verlaine e de Rimbaud arrancando, aos flagelos da poesia, a incompreensão de um amor arrebatador. As saudades crisparam-se e, eu, incentivei o Grul e o Grol a movimentarem os skates com o ritmo da delicadeza poética. Depois de atravessar uma corrente de ar do Poente, parámos diante do belo Dorian Gray.
- Olá Dorian. Em que esperança vives?
- Não vivo de esperanças, mas da pintura, em que o Oscar Wilde, me eterniza, para glória dele, e para o espectáculo efémero das minhas cinzas.
Dito isto, Dorian, sentindo poisar na sua moldura um corvo negro, perguntou-lhe se sentia saudades do Poe, ao que ele lhe respondeu, "Nunca Mais".
O Grul e o Grol que não gostavam de corvos, sentaram-me nos skates e escaparam-se pela auto-estrada 999, sempre a caminho do Norte, que ficava a uma distância incalculável. Levei a harmónica aos beiços e despachei para o vento da eternidade, o blues, "Shake Your Maneymaker".      
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Criado, em 05 de Junho de 2012, na Biblioteca Nacional, às 14H42.
Escrito, directamente, no blogue, na Biblioteca Nacional, no dia 05 de Junho de 2012, às 14H43, e, concluído, às 15H17 do dia 05 de Junho de 2012.

Sem comentários:

Enviar um comentário