Subiu as escadas. Mora em um sétimo andar das Avenidas Novas. Quasi sem fôlego tirou as chaves do bolso e entrou em casa. Tirou os sapatos cor de cinza, estirou-se na cama e respirou aliviado. Colocou os headphones na cabeça e ligou o iPod. Uma mescla de sonoridades suavizou-lhe o coração, adormeceu-lhe a tensão de um dia agitado. Jantou fora, bebeu demais. Sábado, 01h30 da madrugada. Pensou na vida, amontoaram-se as dúvidas de uma existência febril e de uma vadiagem noturna que o assustava como se fossem as dores de um parto difícil. De olhos fechados, sentia-se leve como uma nuvem arrastada pelo vento, grávida de lágrimas, choro que não o libertava das mágoas em que se consumia todas as vezes que uma das faces do seu namoro transpirava um nevoeiro de desejos incontroláveis. Não receava desatar os nós que os prendiam, mas a solidão implorava-lhe que rejeitasse a tristeza de uma decisão que o afastava da vivacidade e de uma adolescência que se recusava abandoná-lo. Vinte e um anos era o início de uma viagem, clara e doce, e não um desprezo que a menosprezasse. Porém, por muito que a claridade lhe viciasse o clamor das ideias, uma espécie de formigueiro mental imobilizava-lhe o prazer da vida. Cansado, sem saber porquê, levantou-se, abriu a janela do quarto e sentiu uma força irreprimível de esquecer a vida e abraçar a morte. Desejo inútil, mal divisou, diante do seu olhar, o rosto terno da sua namorada que, com os seus cabelos compridos batidos pela suavidade do vento, lhe oferecia um dos seus mais belos sorrisos. Fechou a janela, visitou a cozinha, fez uma sandes e retirou do frigorífico um sumo de manga. Sentou-se na cadeira de baloiço e pensou na estrada com que o Futuro o visitava. Frequentava a universidade, sonhava com uma licenciatura, mas observava no horizonte uma chuva miudinha de mágoas que o entontecia com um formigueiro de dúvidas percorrendo os seus carreiros de projetos dissolvidos pela fragilidade dos tempos em que vive. Um repentino gesto de enfado fatigou-lhe o corpo, despertou, no mais profundo do seu ser, a vontade férrea de enganar a realidade e fustigar-lhe o castigo com a decisão inabalável de restituir ao seu corpo, meio anestisiado, a vitamina emancipadora de ser um fruto apetecível na vasta amargura de um cosmos laboral que lhe irrita, profundamente, a dávida vida. Levantou-se, com um sorriso nos lábios, estendeu-se, na cama, e adormeceu abraçado ao seu velho urso de peluche.
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Escrito e postado, diretamente, no blogue, em 06 de Março de 2013, na Biblioteca Nacional, entre as 15H54 e as 16H04, em 07 de Março de 2013, entre as 12H50 e as 13H10, em 11 de Março de 2013, emtre as 16H12 e as 16H29, em 18 de Março de 2013, entre as 14H44 e as 15H01.
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