A noite é um fascínio, a vida de uma interrogação é um algarismo sem dicionário. Descobrem-se os seus sinónimos na ravina dos seus conceitos. Os pensamentos que me sangravam o poiso luarento de uma sequência imaginária de cenas insaciáveis foram, rispidamente, decepados pela frescura mórbida de umas gargalhadas que incendiaram a noite com os prazeres de uma festividade ...inédita. A claquete da sua voz suspendeu-as.
- Sou filho do silêncio e da razão, sou o futuro de todas as memórias que vestem este corpo de melancolias inóspitas.
- Que memórias, que tempos as vestem?
- Não sei, desconheço a trivialidade do seu consumo em leitos de perfume. Cada passo que dou é um vestígio lunar que pontifica na natureza do meu refúgio mais solene.
Nada mais disse, refugiou-se entre a solidão de um peso e a atmosfera híbrida do seu convento verbal. Levantei-me. Vagabundei, um pouco, pela praceta. Vasculhei a noite e as cores do seu humanismo solitário. Observei o bailado das nuvens que revelavam no seu passeio discreto alterações atmosféricas que se casariam com o hálito nocturno. Observei-o de vários ângulos. Parecia ter adormecido. No entanto, os seus olhos luziam, parecendo os farois de um temporal na calma suicida de um novelo sufocante. Sentei-me a seu lado. Não se moveu, não deu pela minha presença. A súbita obscuridade que abraçara a noite transformou-o em uma espécie de estátua cujos contornos fustigavam a embalagem da sua vida.
Jorge Manuel Brasil Mesquita.
Biblioteca Nacional, 17 de Janeiro de 2013, entre as 14h36 e as 15h20.
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